01 abril 2021

Porto Alegre | Um porto que busca se redefinir

 



Em meados do séc. 19, começou um pequeno povoamento à margem direita do lago Guaíba, (ou rio, como ainda querem alguns) onde abrigaram-se famílias de imigrantes açorianos (500 pessoas), em princípio por tempo determinado, já que pela ideia inicial a região das Missões Jesuíticas deveria ser o destino final do grupo, no contexto da disputa por territórios entre os impérios português e espanhol. Tal plano nunca se efetivou. Às margens do Guaíba, (1) habitaram por milênios índios entre eles tapuias e depois carijós do ramo tupi. No início da colonização portuguesa, era chamado de Porto de Viamão, então capital da capitania do Rio Grande de São Pedro. Depois Porto dos Casais e mais adiante Nossa Senhora da Madre de Deus de Porto Alegre, nome que recebeu já como freguesia, com 1.500 pessoas. Daí, a designação atual.

Em 1900 a cidade já contava com algo em torno de 75 mil habitantes. Seu comércio crescia impulsionado principalmente pelas atividades econômicas dos colonos alemães e italianos. Tornou-se necessária a criação de um porto com a finalidade de substituir docas e trapiches de madeira para escoar a contento os produtos. Em 1911, o engenheiro Cândido José de Godói, secretário de obras públicas no governo de Carlos Barbosa, apresentou um plano ambicioso e bem-sucedido: a construção de um porto de águas fundas para acesso direto ao mar através da Lagoa dos Patos.

Em 1921, no governo de Borges de Medeiros, inaugurou os quase 500 metros iniciais da obra, depois de uma disputa entre o estado e a União para quem seria responsável pela administração do porto. Borges venceu a parada, alegando que como se tratava de um porto fluvial (o maior do Brasil), cabia o controle administrativo ao Estado. Finalizou seu mandato tendo construído o Pórtico Central, um prédio administrativo e 10 armazéns, ao longo de 1.652 metros. O porto cumpriu seu papel no processo de crescimento das exportações gaúchas, que atingiram um percentual de quase 40% entre 1933 e 1938. Em 1941, porém, as coisas começaram a mudar. Por três semanas, entre abril e maio, a cidade foi abalada pela maior enchente de sua história, com um prejuízo de US$ 50 milhões. Um quarto dos moradores ficaram desabrigados. O centro da cidade foi o mais atingido pelas águas, como bem mostram fotos da época. O Plano Rodoviário Nacional (1944), interligando estradas; o congestionamento de barcos; o advento do contêiner dispensando mão-de-obra passou a exigir instalações muito maiores, afastadas das áreas urbanas. O porto entrou em decadência. Em 1974 achou-se por bem a construção de um muro ao longo de sua extensão na região central da cidade para protegê-la das inundações. O acesso livre a ele chegava ao fim.

A exemplo do porto Madero, em Buenos Aires, projetos de revitalização e aproveitamento de espaços multifuncionais esbarram na falta de verbas e rompimento de contrato para tal finalidade em função de descumprimento de prazos e outros motivos. De qualquer forma, a boa notícia é a inauguração adiada em função da pandemia do Cais Embarcadero, numa área de 640 metros entre o Armazém 7 e o Centro Cultural Usina do Gasômetro, com bares, restaurantes, praça náutica e área cultural. Hotel, shopping a céu aberto e centro de eventos são ideias para outros projetos futuros. Espera-se um mínimo de bom-senso por parte dos administradores públicos e não elitizá-los por demais. A população como um todo tem direito a ser ouvida a respeito.


(1)  Uma das explicações etimológicas para Guaíba é a seguinte: gua (lagoa) + a'iba (ruim) = brejo, pântano". Cp. com Paraíba: do tupi pa'ra (rio) + a'iba (impraticável à navegação), igualmente apenas uma das possibilidades.


Referência:

FONSECA, Caue. Quando Porto Alegre tinha um porto. Zero Hora, Porto Alegre, 27-28 mar. 2021. Doc, p. 6-7.

Foto de Elisabete Denovaro.


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