04 abril 2022

(1) Séc. 19 | Relatos de viajantes alemães sobre Porto Alegre

 


Com construção finalizada em 1913, o antigo prédio dos Correios e Telégrafos, atual Memorial do Rio Grande do Sul (foto), teve como engenheiro responsável Rudolf Ahrons (1869-1947) e como arquiteto, Theodor Wiederspahm (1878-1952), o primeiro nascido em Porto Alegre, e o segundo, alemão, naturalizado como brasileiro. Vale ressaltar que são de autoria de Wiederspahn, alguns dos prédios de maior valor histórico da cidade. Além da antiga sede dos Correios, vale destacar a Delegacia Fiscal da Receita Federal, a Faculdade de Medicina da UFRGS, o Hotel Majestic (hoje Casa de Cultura Mário Quintana), a sede da Previdência do Sul (Banco Safra) e a Cervejaria Bopp (Shopping Total).


Coube a Gilberto Freire, como cientista social, o pioneirismo de divulgar livros de viagem de viajantes estrangeiros a respeito de suas experiências pessoais, percebendo neles uma rica fonte para um conhecimento maior de história. Neste série de postagens, pretendo focalizar especificamente aqueles de origem alemã, que em seus livros fizeram menção à Porto Alegre, que conheceram, em maior ou menor grau, e incluir na lista um ou outro imigrante que também registraram no papel suas experiências de vida na nova pátria.   



Carl Seidler

Carl Friedrich Gustav Seidler, suíço-alemão, chegou ao Brasil em fevereiro de 1826 e no Rio de Janeiro alistou-se ao Exército Imperial, na condição de alferes, tendo participado da campanha da Cisplatina, em que o Brasil veio a anexar o Uruguai ao seu território por um certo tempo. Em seu livro Dez anos no Brasil, traduzido e editado pela Martins (1976), faz referências a Porto Alegre, onde as embarcações transportando militares aportavam com o intuito de se abastecerem para o destino final. Encontrou uma cidade de 16.000 habitantes e destaca na obra as relações comerciais da cidade com as colônias alemãs já existentes. Entre outras coisas, faz referência ainda aos diversos negociantes europeus na cidade, principalmente franceses e ingleses. 

Os imigrantes alemães trabalhavam como operários: marceneiros, alfaiates e sapateiros. Eram agraciados com melhores salários do que os nacionais, em vista da qualidade de seu trabalho. Com o tempo, começaram a faltar ao serviço para frequentarem restaurantes alemães, onde acabavam se envolvendo em pancadarias, perdendo o bom conceito que gozavam junto aos brasileiros, embora sem prejuízo para seus dividendos mais afortunados. Seidler não deixa de registrar em seu livro de memórias seu desgosto pelo fato de seu soldo como militar estar atrasado há mais de dois anos...


 
À esquerda, fábrica de charutos, de propriedade do Sr. Hanssex, ao lado de uma fábrica de chapéus, do Sr. Sommer.


Johann Karl Dreher

Dreher nasceu em 1820 na cidade de Vollmersbach, Alemanha, e faleceu em 1898 em Porto Alegre. Imigrou para o Brasil em 1840, tendo se estabelecido em Porto Alegre à época da Revolução Farroupilha. Nela viveu os últimos dias de uma cidade sitiada, durante quatro anos, pelas forças revolucionárias. É interessante mencionar, de passagem, que Porto Alegre, assim como outras localidades litorâneas, nunca aderiu à Revolução e até hoje exibe em seu brasão o título que recebeu do Imperador de "mui leal e valerosa cidade de Porto Alegre".

Para as gerações futuras, deixou datilografadas suas memórias em 23 páginas, hoje fazendo parte do acervo do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul. Quando chegou a Porto Alegre, vindo de navio, foi recebido por Karl Diehl e acabou hospedando-se em casa de uma terceira pessoa, também alemã, na qual foi "extremamente bem recebido". De qualquer forma, passou várias noites sem dormir por causa dos mosquitos, que o "maltrataram terrivelmente". As coisas só melhoraram quando passou a usar um mosquiteiro, a conselho de um médico que consultou em função de mordidas que provocaram inchações. Duas semanas depois, fez sua primeira viagem a São Leopoldo (homenagem à Imperatriz) através de um barco, no qual a única opção de sentar-se era sobre caixas e sacos, de uma maneira bastante desconfortável. Em função do conflito, foi uma viagem em que houve a necessidade de conseguir previamente uma autorização por parte da autoridade máxima da província para ser realizada. Um navio de guerra atracado no porto controlava as entradas e saídas da cidade.

"A cidade de Porto Alegre, cercada por um cinturão de valos de proteção (trincheiras) que, de trechos e trechos, eram protegidas por canhões de defesa, apresentavam antes um aspecto de destruído que alegre" - escreve em suas memórias. Vestígios da última ocupação por parte dos farrapos ainda eram visíveis em vários pontos da cidade. Afirma nesse outro trecho que já conhecia sobrenome de todas as família alemãs que moravam na cidade. Já havia em Porto Alegre duas casas de artigos coloniais (de "secos e molhados") como firmas importantes: Friedrich Bier e Bormann & Cia. Na verdade, o comércio local acabou sendo dominado pelos teutos e em segundo lugar, pelos portugueses, durante um certo tempo.


Fonte |

Os viajantes olham Porto Alegre: 1754-1890, de Valter Antonio Noal Filho e Sérgio da Costa Franco. 


Mais |

Wilhelm Breteinbach, um viajante alemão 
na Porto alegre do séc. 19


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