03 setembro 2022

A CRISE do Absolutismo e a Independência do Brasil (Parte 1)

 




"O Brasil nasceu de uma crise fiscal." Assim Rafael Cariello e Thales Zamberlan Pereira iniciaram sua matéria* tendo como título "A crise inaugural", publicada na revista Piauí de out/2021, da qual extraí algumas informações a serem desenvolvidas nesta postagem. No início do séc. 19, 
"as insatisfações e os conflitos provocados pelo descalabro financeiro da Corte joanina trariam como resultado a ruína do absolutismo e a instalação de uma monarquia constitucional na América do Sul."

Na verdade, uma crise não só de cunho fiscal, bem como acompanhada de inflação e insatisfação generalizada, tanto na então colônia portuguesa na América quanto em Portugal. A discussão que tomou vulto à época tinha a ver com a seguinte questão: quem deveria tomar decisões sobre orçamento: apenas o rei ou os representantes dos cidadãos e contribuintes? Além disso, novas ideias em voga passaram a opor-se ao absolutismo como sistema político dos países europeus desde o séc. 16, através do qual reis e imperadores assumiam poderes políticos ilimitados.

O início do séc.19 foi marcado pelas Guerras Napoleônicas (1803-15), o que obrigou a Portugal a fazer gastos de defesa muito superiores ao que suas receitas suportavam. Mais de 50% delas eram direcionadas para a defesa, fato que não impediu a invasão do país por tropas francesas em novembro de 1807. Como aprende-se na escola, tanto a Corte portuguesa bem como a família real transferiram-se às pressas para o Brasil, o que não deixou de ser uma sacada genial, diga-se de passagem. 

De qualquer forma, os gastos palacianos continuaram a mil, inclusive em função da manutenção de centenas de funcionários e desembolsos com cortesãos no Rio de Janeiro. Ao mesmo tempo, em Portugal os representantes do rei continuavam com a incumbência de manter um exército, liderado pela Inglaterra. Em 1815 finda o conflito no continente europeu. Alívio para as finanças? Que nada! João 6º abre uma nova frente de batalha: invadir e conquistar a região Cisplatina (Uruguai). Disso resultou na elevação dos impostos e criação de outros - uma solução apenas parcial que provocou uma insatisfação generalizada principalmente no que hoje conhecemos como o Nordeste brasileiro, em função de uma pesada tributação ligada à produção de tabaco, açúcar e algodão. 

Em 1808 é criado o Banco do Brasil. A emissão descontrolada de papel-moeda para cobrir receitas e despesas resultou em inflação. Itens essenciais na alimentação da população, como a farinha de mandioca e o charque sofreram fortes aumentos entre 1815 e 1820, significando um aumento nos custos dos grandes proprietários às voltas com a alimentação de seus escravizados. Além disso havia os gastos consideráveis com soldados e milícias espalhados pela colônia para a manutenção da ordem.

Em 1819, por

"conta da carestia, da inflação sobre os preços dos mantimentos, a população da cidade do Rio de Janeiro viu-se em meio à maior crise de abastecimento de que se podia ter memória e, irada, instou providências rápidas junto ao rei"

(Jurandir Malerba, historiador)

Em Salvador, pessoas empregadas nas escolas de primeiras letras enviaram uma petição ao monarca solicitando um aumento salarial por causa da "carestia de víveres", "em uma grandeza de preço inconjecturável". Afinal, outros funcionários públicos já haviam ganho reajustes salariais pelo mesmo motivo. Como podem ver, não é de hoje. Uma onda crescente de insatisfações eclodiu tanto no Brasil quanto em Portugal. A coisa toda iria fed..., ferver.


* O texto dos autores foi um excerto, com ligeiras modificações, do primeiro capítulo do livro "Adeus, Senhor Portugal: Crise do Absolutismo e a Independência do Brasil", escrito por eles e recentemente lançado pela Companhia das Letras. 

Imagem: Pedro Américo, Public domain, através da wiki Wikimedia Commons


Parte final em

https://cesardorneles4.blogspot.com/2022/09/a-crise-do-absolutismo-e-independencia_5.html


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